fundo

Quando aceitamos o que recebemos, vivemos melhor. Quando as adversidades nos ensinam a nadar, atravessamos o mar. Quando as barreiras dizem que não podemos e não somos capazes, podemos nos redobrar de forças e vencer os obstáculos .

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Na Peregrinação





Desde a mudanca de Chico [Xavier] para Uberaba, todos os sábados ele se reunia com elementos do seu grupo e os amigos espíritas, para realizar a caminhada em visita aos lares carentes na área onde hoje se estende a maior parte do Parque das Américas.
O pessoal se postava diante do centro espírita, em que Chico atuava, localizado no loteamento ainda pouco habitado, com casas espalhadas e sem iluminação pública.
O médium chegava, detinha-se alguns minutos para os cumprimentos, em seguida fazia-se uma prece e iniciava-se a caminhada para as primeiras visitas.
Em uma das vezes que estivemos na "peregrinação" -nome dado àquelas caminhadas - soubemos que, no sábado anterior, alguns meninos das cercanias também acompanhavam o grupo.
Entre as traquinagens com seus coleguinhas, um deles acabou por cair num poço que estava sendo aberto.
Em meio à consternação causada, Chico logo soube e pediu que se providenciasse uma corda. Enquanto esperavam por ela, ficaram em prece.
O local estava escuro, mal se via o buraco do poço. Quando a corda chegou, foi lançada ao fundo e o menino, agarrando-se a ela, foi retirado são e salvo. Aparentemente tudo acontecera de forma natural.
No dia seguinte, contudo, alguém, para tirar dúvidas quanto ao que presenciara, conseguiu ter em mãos a mesma corda usada na véspera e repetiu seu lançamento à luz do sol, a fim de verificar até onde ela chegava.
Qual não foi sua surpresa ao constatar que sua extensão alcançava um pouco mais da metade da profundidade do poço, visto ser esta bem maior do que se pensara na véspera.
E o garoto não sofrera nenhum dano!
A testemunha que nos contava a extraordinária ocorrência pediu-nos discrição, pois o médium não queria que se divulgasse o fato.
É fácil entender o cuidado de Chico ante o fenômeno que ocorrera, pois, se divulgado, seria considerado como miraculoso pela população das cercanias, dando uma conotação que não interessava ao trabalho junto às famílias carentes.
E, para os amigos espíritas, vindos dos mais distantes pontos do país, a “peregrinação” era também uma aula ao vivo de como praticar a caridade, enfatizando o contato direto com os necessitados. O médium sempre insistia no mister de estarmos próximos dos desfavorecidos da vida, para nos melhorarmos na vivência do Evangelho de Cristo.
Lembramo-nos com muitas saudades das "peregrinações" de que participamos.
Parecia-nos estar nos tempos apostólicos, descritos por Emmanuel, em suas obras centradas naquela época, pelas altas e indescritíveis vibrações que sentíamos, caminhando ao lado do missionário, com sua simplicidade, sempre jovial e amorável, dando o ensejo de nos aproximarmos mais dele, a envolver-nos em sua aura.
Sabíamos, no entanto, que Chico, naqueles momentos, como que procurava apagar a grandiosidade de seu espírito, ligado às Esferas Superiores, para estar fisicamente mais próximo de todos nós, em nome do amor cristão, coroando suas amizades.
A caminhada consistia em singelos procedimentos à porta das casas a serem atendidas.
Lia-se um trecho de O Evangelho Segundo o Espiritismo, iluminado por um lampião do tipo "Petromax", geralmente equilibrado na cabeça de um jovem da equipe formada para esse mister.
Depois da leitura, entremeada de ligeiros comentários, e dos diálogos do médium com elementos da família visitada, procedia-se à entrega de um farnel contendo gêneros alimentícios.
Em certo sábado em que dela participávamos, na última casa a ser visitada, Chico pediu a um rapazola para que proferisse a prece do Pai Nosso. Enquanto ele orava com dificuldade, era observado por nós, pois constatávamos tratar-se de criatura doente, com certo grau de debilidade.
Em seguida, Chico indaga da avó que se encontrava ao seu lado:
— Como vai o nosso menino?
A senhora respondeu no linguajar local:
— Ah! Ele anda meio apavorado. Não sei por que, Chico, ele dá umas risadas esquisitas. Sem mais nem memos, ele solta gargalhadas. Eu fico até assustada...
O médium, então, pergunta ao jovem:
— Você vê alguma coisa, meu filho?
— Não – respondeu ele.
— Então, por que ri?
— Eu rio porque me dá uma alegria!
No rosto dos circunstantes pairava uma indagação, mas o diálogo encerrou-se ali.
Ao nos afastarmos alguns passos do local, Chico comentou:
— Nosso amigo lembra-me Inácio de Antioquia, mártir do Cristianismo.
Conduzido a Roma, amarrado, com os pulsos sangrando, alegra-se ao contemplar o porto de Óstia. Depois da caminhada pela Via Ápia, que separava o porto da capital do Imperito, ao se aproximar da magnificente Roma, sente-se dominado por grande contentamento e põe-se a rir.
O centurião, que conduzia a leva de prisioneiros, não se contendo diante da estranha atitude do jovem, indaga-lhe:
— Você está louco? Ri quando está sendo levado ao martírio no circo?
Responde-lhe Inácio:
— Se os homens houveram por bem construir uma cidade tão bela como esta, imagino a cidade que me aguarda no Céu!
E o médium concluiu:
— Creio que o jovem da casa que acabamos de visitar, dentro de seu mundo interior, pensa assim quando se ri:
— Se este povo – que não sofre – tem coisas tão boas, imagino o que está reservado para mim, que sofro!...
Naquele sábado, voltamos para o centro sentindo o coração repleto das alegrias transmitidas pelos exemplos do missionário de Cristo, alegrias essas somadas ao privilégio de privar algumas horas com ele, pois nunca tivemos dúvidas da distância espiritual que nos separa de sua magnitude.
Sentimos a liberdade de nos expressar dessa forma porque hoje Chico não está mais conosco. Sua missão vitoriosa fê-lo galgar novos páramos nas Esferas de Luz de onde veio.

Livro: Inesquecível Chico

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